19/03/2024

O Retrato do Afro Funk Brasileiro

Tudo que ouvimos de música é originado da África. O rock, o soul, o funk, o samba, R&B são todas de fundação (afro) africana. As origens vêm sido trazidas ao mundo nos séculos passados criando a diáspora africana musical, e assim veio contemplar que a musicalidade africana não tem fronteiras, mas seus variados ritmos é a mais direta conexão com a espiritualidade, ela é a real mentora das novas fusões rítmicas do afro-funk.

A Diáspora africana eternizou heranças espirituais e musicais entre a velha África e o “Novo Mundo” – Mas nem sempre tudo é glória!!!

Entre 1965-1985, período mais fértil do Afro-funk, soul, rock e jazz africano, chegava nos Estados Unidos recriando conceitos, levando ao mundo uma nova versão musical, eternizando-se novas fusões como foi mostrada pelo grande ícone do funk, James Brown. Logo esse país fez notável o funk, o soul, e o jazz americano que chegou através dos mestres como Nina Simone, Al Green, a banda The Temptations e muitos outros.

afro-funk-cbmn1Infelizmente, não é novidade que a exploração da terra mãe desde chegada dos Europeus à África vem criando uma espécie de doença social que “parece ser” incurável. Se exploram muito, mas raro é o investimento interno. Assim também vem sendo na música, que mesmo embora houvesse momentos de glória, mesmo nos anos de auge, muitas dessas músicas não foram devidamente gravadas e muitos de seus criadores não foram propriamente reconhecidos.

Pérolas musicais africanas foram significantemente degradadas e negligenciadas. Entre vários casos aponto a banda Air Fiesta Matata do Kenya. A banda teve convite de Miles Davis para tocar na Alemanha na década de 70, e logo levou a BBC World a proclamar a banda como a melhor banda africana de todos os tempos. Contudo, poucos anos mais tarde, a banda sofreu um grande roubo que os deixou em enorme desfalque nas contas. Sem instrumentos e dinheiro e sem apoio, os músicos nunca mais conseguiram rever os palcos levando vários deles viverem em profunda depressão. Essa é apenas uma triste estória de muitas.

Embora para os Europeus puristas é difícil compreender a música africana como aquela que nasce além das fronteiras desse continente, o mundo vem a décadas respondendo de forma ampla e menos conservadora. A música africana é também aquela que nasce através da diáspora e que leva consigo direta conexão com a ancestralidade. Assim o afro-funk e suas vertentes vem eternizando constante fusão.

Conforme Glaucus Links líder da banda, alabê Ketujazz afirma:
– O olhar do negro é oriental, por isso que a gente precisa mudar o nosso olhar! Não podemos ver com o olhar Europeu, e sim com olhar do africano, esse é o olhar da sabedoria, do sentir.

– Eu tentava racionalizar a música (como eu poderia simplesmente escrever e tocar), mas não era esse o caminho: tinha que olhar como eles olhavam, como eles falavam. Então, eu comecei a entender essa dimensão espiritual – explica.

África segue sendo uma imensidão de aspirações…

Mesmo com as desfortunas da terra, esse continente segue uma imensidão de aspirações musicais em que cada país leva sua peculiaridade sonora. O povo africano vê o purismo musical muito além de fronteiras, contudo aceita sim a diáspora africana musical espalhada por todos os continentes. A fusão é o movimento nobre de fluxos e refluxos.

Assim sentimos a musica desde o funk rústico do Quênia como a banda Matata à suavidade do funk da África do Sul; do poli ritmos do Benin de Angelique Kidjo e do voodo-funk do Apiafo ao afro-beat sofisticado de uma Nigéria Fela Kutiana e do blues e highlife do Orlando Julius; do funk desértico do Mali com sua singularidade do Sahara Árabe da banda Tamikrest ou dos grupos de Timbuktu com o ritmo raí andaluse ao rock-funk experimental do Gana; da sonoridade da África central (Congo) focada nas variantes do soukous (espécie de rumba) que chega a Cuba, Haiti e Colômbia.

Portanto é tudo fusion, é tudo funk, é tudo música de preto, é tudo música original. O funk é a direta ligação com o espiritual, com os ancestrais e com as bases das religiões africanas.

A partir de tudo isso milhões de álbuns e coletâneas de música rara africana vieram ao mercado como Ivory Coast Soul e Love is a Real Funk Fuzzy entre muitas outras.

Afro-funk Brasileiro

As Árvores e raízes são as mesmas, com caules diferentes. (Letieres Leite)

nacao-zumbi-cbmnLetieres Leite, educador e maestro da Orquestra Rumpilezz em suas entrevistas fala sobre o “Pacto de Senzala”, na qual ocorreu inicialmente nos navios negreiros e mais tarde nas senzalas, nas plantações de cana-de-açúcar e demais regiões urbanas ao redor do Brasil. Ele afirma que ali nascia a nossa música, uma fusão e criação de novas formas de demonstração do movimento da musicalidade.

No Brasil o afro-funk é um gênero singular. Desde dos anos 50-60 o Brasil vem explorando sua diáspora de forma a produzir grandes mestres da música de raízes afro-funk brasileiro. Em 1957 a Orquestra Afro-Brasileira mostrou bem essa fusão musical em suas letras e arranjos. Anos mais tarde o mestre Embaixador e a banda Tribo Massáhi e a seguir, Jorge Ben, Banda Black Rio, Markus Ribas, Moacir Santos, Chico Science e outros.

Conversando com o músico André Sampaio do projeto Afromandinga que lançou seu primeiro álbum na linha afro-funk/Afro-mandinga, o LP Desaguou, um estilo voltado mais para raízes de Cotonou (Benin), nos diz que “o segredo do afro-funk brasileiro está em sua fusão rítmica onde a África se encontra com ritmos originalmente brasileiro. Relembra ainda André que toda música de matriz africana segue um sistema rigoroso de clave. “Como diz o mestre Letieres Leite, são padrões rítmicos chamados de DNA do ritmo onde as claves são formas rítmicas que dialogam entre si como o funk, a batida do candomblé, da umbanda, do makulêle, do jongo que por sua vez originou o conhecido funk-carioca”.

Os ritmos dialogam entre si

Jorge Dubman, líder da banda Ifá que acaba de lançar o álbum Ijexa funk afro-beat nos diz que o “Afro-funk brasileiro está ligado diretamente as raízes originalmente brasileira passando pelo samba do côco, afoxé, ijexá, o baião, o forró e o maracatu”. O que podemos ver que a riqueza do afro-funk é presente até na bossa nova. Percebemos essa fusão quando ouvimos o álbum do Baden Powell com Vinicius de Morais, Afro-samba, lançado em 1966. Álbum considerado por muitos críticos como um divisor de águas na MPB por apresentar elementos da sonoridade africana ao samba.

Assim o que vemos é uma riqueza musical no Brasil onde todos os ritmos dialogam entre si e todos dentro da dimensão do afro-funk brasileiro. O que o mundo ainda fechado em seus limites não sabe é que o Afro-funk brasileiro é umas das maiores descobertas condutoras de linguagem própria.


O Afro-funk vai além…

Assim como existe esta conexão entre a música afro-funk brasileira, a música africana está também na salsa venezuelana, na cumbia colombiana, na música afro-peruana, e no candomblé uruguayo, etc. El Merengue por exemplo é mais popular na ilha Espanhola ao cruzar dois países, Haiti e a República Dominicana, gênero que combina os ritmos africanos com melodias espanholas.

Assim é no Brasil e em toda América Latina e no Caribe, as línguas africanas se encontraram com as dos europeus e indígenas e se produz grande enriquecimento sonoro, provocando câmbios semânticos, fonológicos e morfológicos. A música vem sido parte dessa transformação. E, portanto, a África e o afro-funk tem sido presente assim, na música Afro-panamenha, Afro-Cubana, Afro-equatoriana, Afro-boliviana, Afro-peruana e até no tango argentino

Mas existem muitas discussões musicais, sobre estilos de músicas encontradas nas Américas e no Caribe, que normalmente se referem como procedentes da África. O ponto é compreender que a música africana e o afro-funk são aquelas também fora dos limites fronteiriços, e que em coesão são as que se conectam espiritualmente umas com as outras. A diáspora africana, a responsável por levar essa musicalidade aos continentes, nos mostra que o único e maior segredo presente nessa fusão é: A Clave Rítmica!!!

FONTE:
– Clave: The African Roots of Salsa.” Kalinda!: Newsletter for the Center for Black Music Research, Fall (1995): 7-11. Reprinted in Clave (1) 2, (1998): 2-3.
www.terreirodegriotos.blog
www.funkish.audio/african-funk-music
www.losmulatos.com/influencia-africana-en-el-folklore-latinoamericana/

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